Era um
menino bonito. Cheio de vida. Simpático.
Corria alegremente pelo pátio do
grupo escolar. Mais tarde era o centro das atenções no pátio do colégio
estadual. Para o qual galhardamente fora aprovado no difícil exame de
admissão. Estou falando sobre a década de 50 na pacata Santa Maria, RS.
No
entanto, o adolescente tinha um certo desvio comportamental. Gostava de abusar
com os colegas de famílias mais pobres. Os que não usavam roupas de grife. E
muito menos frequentavam os salões do Comercial. As reuniões dançantes do
Caixeiral.
E fazia
isso acintosamente. Jogando no ridículo os baixinhos. Os gagos. Os que tinham
deficiência visual. Os que usavam óculos de aros grossos. A quem ele chamava de
"quatro-olho".
Tinha
predileção por tirar sarro - "inticar" se dizia naquela época - com
um aluno tímido, calado, de boca pequena. A quem ele apelidou de
"boquinha-de-chupar-ovo".
Passaram-se
mais de três décadas.
E cada
aluno tomou seu rumo. Foi trilhar seu destino.
Por estes
estranhos desígnios, o galã, grande gozador de outrora e de futuro brilhante,
virou ascensorista.
E o
"boquinha-de-chupar-ovo" passou a subir pelo elevador onde seu
outrora algoz trabalhava. Porque tinha consultório naquele prédio.
Um dia o
encontrou deitado no elevador, bêbado, vomitado e urinado.
Foi
aposentado por alcoolismo o outrora gozador.
Abandonado
pela mulher, meses depois deu um tiro no ouvido.
Enquanto
o outro, tímido e pobre garoto de outrora, continua dar suas consultas.
E na hora
de folga come torrada com ovo no bar do prédio.
Deixando
cair alguns respingos de gema no avental imaculado.
Com sua
pequena boca de chupar ovo.
Um comentário:
Sensacional!
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