segunda-feira, 18 de abril de 2022

OS "BIXOS" DA UFSM - JAMES PIZARRO (DIÁRIO - 19.04.2022).

Mesmo antes de fazer vestibular (e ser aprovado na UFSM em janeiro de 1963), eu já ministrava aulas de Biologia. Comecei no Colégio Sant*Anna, com apenas 17 anos, a minha carreira docente. Ao mesmo tempo, dava aulas no Curso Binatão (nas dependências da própria UFSM). E comecei no Instituto Master, que funcionava no edifício Segala, no calçadão, onde funcionou anos depois a Rádio Guarathan, junto com uma equipe notável, entre os quais destaco meu saudoso ex-professor/colega/amigo, Paulo Lauda. Dei aulas também no Riachuelo, Coração de Maria, Curso Positivo, Arca de Noé, Preparatório da ESA, etc...Somados aos quase 40 anos de aulas na UFSM, dediquei mais de meio século de vida a falar durante horas e horas diariamente para turmas de jovens sobre Biologia e a vida em geral. Por que fiz essa introdução ? Para dizer ao leitor que acompanhei na vida real e na prática diária a evolução dos costumes estudantis. Das festas universitárias. Participando dos fatos – como aluno e depois como docente – durante cerca de seis décadas. Não me atreverei – qual velho ranheta – a fazer juízo de valor e emitir opiniões moralistas sobre isso ou aquilo. Apenas quero narrar – como memorialista - como era na década de 60, a recepção ao calouros da UFSM, os chamados “bixos” da UFSM. Cada curso da UFSM recebia seus calouros de maneira amistosa, com brincadeiras, pinturas no rosto, trotes. Não havia ainda o hábito de se cortar o cabelo dos calouros. Cada curso da UFSM fornecia aos seus calouros uma “característica” (um avental, pala, boina, chapéu, cartola, espada,etc...com o nome do curso e suas cores) que deveria ser usada obrigatoriamente durante todo o mês de março. E essa “característica” era entregue ao calouro durante um baile solene realizado no Caixeiral ou Comercial, animado por orquestras e conjuntos famosos na época. Assim é que, durante todo o mês de março tínhamos o Baile dos “Bixos” da Medicina, da Farmácia, da Agronomia, etc...nos quais cada calouro recebia de sua madrinha(namorada, mãe, noiva, “ficante”) a “característica” que o identificava como universitário dali por diante perante a comunidade. Reitor, professores e autoridades prestigiavam esses bailes que estavam sempre superlotados. No entanto, o ápice da festa universitária de recepção aos calouros da UFSM na década de 60 sempre foi a famosa e até hoje lembrada com saudade, “PASSEATA DOS BIXOS” ! Todos os calouros da UFSM, separados por curso, desfilavam vestidos com fantasias e portando cartazes com críticas de toda ordem contra qualquer fato, pessoa, autoridade, políticos. Etc....da vida nacional e internacional. Peças rápidas de teatro eram encenadas rapidamente, para delírio da população que superlotava a rua do Acampamento, av. Rio Branco e rua dr. Bozano. Também carros alegóricos desfilavam com cenas humorísticas encenadas. No caso da minha turma, Agronomia/1963, além participarmos da passeata e do baile dos “bixos”, nós fizemos um trote solidário em prol da população carente. Durante um dia inteiro percorremos as ruas da cidade com um caminhão e aparelhagem de som e pedimos alimentos para os asilos da cidade. Lotamos um caminhão arroz, feijão, massa, sal, enlatados, etc....fato que teve enorme repercussão na cidade. De vez em quando, para reparar as energias, corria um copo de vodka com Cirillynha. Ou uma garrafa de “samba” (Coca Cola gelada com cachaça). Era o máximo de devassidão permitida...

segunda-feira, 4 de abril de 2022

Passos lentos. olhar perdido, ardência no peito - JAMES PIZARRO (DIÁRIO - 5.4.2022)

Não deboche / agrida / brigue / ofenda seus colegas / amigos/ parentes / conhecidos /vizinhos por causa das eleições presidenciais. Com estas atitudes você não vai conseguir nada, a não ser inimizades / má vontade / distanciamento / desamor / solidão. Seja qual for o ganhador, eles jamais saberão da sua existência e de seus problemas. Tenha sua opinião / candidato / partido. Mas aceite que os outros também possam ter. Ninguém tem o monopólio da ética / moral / verdade. Portanto, é hora de pensar várias vezes antes de falar / escrever / vociferar ! Quase octogenário, não escrevo mais há décadas sobre política, futebol e religião. Mesmo porque existe gente muito mais preparada do que eu para tratar destes temas. Resolvi investir na saúde das minhas coronárias. Para conviver mais tempo com meus netos. E escrever sobre amenidades, O cotidiano. Contar coisas perdidas na memória. Reviver coisas. Falar até sobre filmes. Noite dessas – num dos canais da TV a cabo (acho que no Paramount) – assisti a um filme muito antigo O título era “Clamor de Sexo” (de Elia Kazan) e “Eva” (de Joseph Losey). Filme feito há mais de 60 anos, é sobre a família e seus conflitos. Sobre o amor e sexo entre os jovens. Pais que são contra namorados dos filhos. Professores e pais que jamais aprenderam a ajudar seus filhos e alunos. Famílias que eram ricas e a depressão econômica tornou pobres. Mas o que mais me chamou a atenção no filme é uma cena melancólica. Os dois namorados, cujo amor não deu certo por causa de múltiplos fatores, se encontram muitos anos depois. E é uma decepção total. O grande objeto de desejo de outrora não significa absolutamente mais nada. Tudo terminou. Eles estão secos por dentro. São estranhos. É um encontro pungente. Que remete à solidão. À melancolia. Os mais jovens que fazem leitura dos meus textos experimentarão esta mesma sensação futuramente. Pode ser com uma colega de infância. Uma namoradinha que ocupou seu cérebro e sua alma com sofreguidão. Uma colega de faculdade. Pessoas que foram importantes no seu mundo afetivo. Passarão os anos. E ao rever aquela pessoa que deixava seu coração em chamas, ela se transforma num borrão na paisagem. Não lhe diz mais nada. Tudo virou uma oceânica decepção. E você vira as costas. E saí caminhando. Passos lentos. Olhar perdido. Uma ardência no peito. E uma certa estupefação diante do mundo.