terça-feira, 20 de outubro de 2020

AO SERGINHO SEGALA, COM AFETO - JAMES PIZARRO (DIÁRIO, página 4, edição de 20.10.2020)

Dia 26 deste mês de outubro, contrariando os prognósticos sombrios e pessimistas de uma conhecida vidente que vaticinou que eu não chegaria aos cinquenta anos, completarei 78 anos. Gostaria de mandar uma fatia de bolo para a tal vidente que fez chegar até mim sua mensagem através de uma aluna, mas a referida me antecedeu na viagem espacial e partiu precocemente. Mas eu queria dizer é que, como idoso, sou leitor assíduo do “Diário Bem-Viver”, caderno especial que nosso jornal publica nas edições de fim-de-semana contendo reportagens e informações sobre saúde. E que são muito úteis e informativos. No último dia 18 comemorou-se o Dia do Médico porque é o Dia de São Lucas, o santo padroeiro da Medicina. E eu não queria deixar de fazer algumas considerações a respeito. Por uma série de razões. Tive muitas centenas de alunos nos cursinhos pré-vestibulares ao longo de mais de quarenta anos de docência que se transformaram médicos, muitos deles atuantes em Santa Maria e alguns meus médicos há anos. Cito, entre muitos deles : Dra. Jane Costa, Dra. Alba Tereza do Prado Veppo Prolla, Dr. Chariff Ddine, Dr. Glauco Alvarez, Dr. José Pedro Lauda, Dr. Reinaldo Ritzel, Dr. Mauro Merten, Dr. Laranjeira, etc Fiz o Ginásio e Científico no MANECO. Minha turma do Científico é de 1962 com vestibular feito em janeiro de 1963. Puxando pela memória, lembro que de nossa turma saíram 11 médicos : Telma Cordeiro D’Ornellas, Oldemar Weber, Luiz Osvaldo Coelho, Dari Pretto, Nelson Segala, Izidoro Lima Garcia, José Amilton Acosta, Luiz Régis Agne Stein, Carlos Horácio Hertz Genro, Flori Machado Sobrinho e Sérgio Segala. Infelizmente, já nos deixaram os amigos Oldemar Weber, Nelson Segala, Izidoro Lima Garcia, José Amilton Acosta e Sérgio Segala. Ao longo dos último meio século mantive contato mais próximo com uns. Mais esporádico com outros. O Luiz Osvaldo é casado com a irmã da minha mulher, foi diretor do Curso de Medicina da UFSM, mas há anos mora em Porto Alegre. O Nelson Segala e o José Amilton davam aula no mesmo prédio do campus que eu (prédio de número 19), o que proporcionava encontros e bate-papos quase diários. O Floria Machado Sobrinho é médico em Brasília, já tentei localiza-lo, deixei recados, mas nunca retornou com notícias. O Carlos Horácio encontro de quando em vez. Com quem eu mais falava era o Serginho Segala. Mas o Serginho morreu a semana passada... Uma das minhas netas há mais de seis anos foi diagnosticada pelo meu querido amigo Dr. Valdir Pereira e sua equipe com Mal de Hodgking, um tipo de câncer linfático. Ela teve de fazer implantação de catéter para a sequência da quimioterapia, perdeu peso, ficou carequinha, etc E continuou seu curso universitário aquele semestre com as dificuldades compreensíveis. Está formada. Não precisou fazer todas as sessões de quimioterapia previstas. O Serginho sempre disse para ela : “Em todas as tuas sessões eu vou ficar contigo porque tu és neta do Pizarro e eu sei o quanto ele te adora....ele foi meu colega e é meu grande amigo...tu vais sair daqui curada”. Anos depois ele a chamou e disse : “Hoje vamos retirar o cateter. Tu estás curada.” Serginho, meu querido : obrigado por ter sido carinhoso e competente com minha neta. Ela chorou muito quando eu disse a ela que morreste. Nossa família vai rezar muito por ti ! Até qualquer dia !

terça-feira, 6 de outubro de 2020

PAULINHO, ATOR E BILHETEIRO - JAMES PIZARRO (DIÁRIO, pág.4, edição de 6.10.2020)

Convivi no centro da cidade de Santa Maria, por mais de cinquenta anos, com o Paulinho, o meu querido amigo anão bilheteiro, batizado Paulo Neron Rodrigues. Especializado em vender unicamente bilhetes de loteria da Caixa Econômica Federal. Ele me reservava bilhetes sob encomenda, com a centena final do número da casa do meu pai na rua Silva Jardim : 2431. Anos a fio, comprei bilhetes de final 431. Como eu dava aulas no recém-criado Instituto Master que funcionava no Edifício Segala, onde anos depois funcionou a Rádio Guarathan, encontrava o Paulinho diariamente no Café Cristal, para um bate-papo e para o cafezinho e fofocas do dia. Seu Bráulio Araujo Souza, funcionário da Livraria do Globo e que seria meu futuro sogro, participava da conversa. Ele era tesoureiro da Escola de Teatro Leopoldo Froes e muito amigo também do Paulinho, que – afinal – era amigo de toda a cidade. Paulinho era ator amador da Escola de Teatro Leopoldo Froes, criada e dirigida durante toda sua existência pelo teatrólogo e memorialista Edmundo Cardoso, pai do Claudinho Cardoso, figura conhecida e querida de todos nós. Paulinho atuou em várias peças infantis da escola de teatro, ao lado de dezenas de outros conhecidos, como os amigos Horst Oscar Lippold (“Tio Óca”, do SOCEPE) e o Raphael Theodorico da Silva (“Pinha”, falecido em 2015). Assisti a todas as montagens da Leopoldo Froes, especialmente aquelas onde o Paulinho trabalhava (“Pluft, o Fantasminha”, “Maria Minhoca”, etc....), mas lembro em especial e com muito carinho do sucesso da “Dona Patinha Vai Ser Miss”. Tenho bem vivo o carinho que o Paulinho teve para com o Claudinho logo depois do falecimento da saudosa Edna May Cardoso, sua mãe e a demonstração de viva amizade para com seu velho amigo e diretor Edmundo Cardoso. Paulinho morava bem perto do calçadão, à Rua Dr. Pantaleão. E nos finais de tarde, depois de esgotada a venda dos bilhetes e vencida honestamente mais uma jornada de trabalho, Paulinho costumava escutar o noticiário, comer um lanche e tomar uma cerveja num pequeno restaurante que então existia ao lado na Mercado Itaimbé, na Venâncio Aires, a caminho de sua casa. Quando o querido amigo Paulinho faleceu lembrei de uma crônica do festejado teatrólogo e escritor Nelson Rodrigues onde ele afirmava nunca ter visto ou ouvido falar no enterro de um anão. Nelson Rodrigues, vivo fosse, teria ficado surpreso com a quantidade de pessoas, amigos e autoridades no velório do nosso querido Paulinho, tal seu prestigio e sua popularidade. Nesse meu isolamento social que já dura mais de seis meses recomendado pela minha médica por causa da pandemia, uma vez que pertenço ao grupo de risco por causa da idade e sobrepeso, tenho escrito muito sobre a memorialística da cidade. E minha cabeça, durante as madrugadas em que perco o sono, tem sido povoada pelas lembranças de centenas de pessoas queridas com as quais tive a felicidade de conviver. Na última madrugada pensei muito no Paulinho e no bilhete que sempre guardava para mim. Hoje vou pedir para alguém comprar o bilhete da Federal de final 431...

sábado, 3 de outubro de 2020

ARMANDO VALLANDRO E A COOPERATIVA DOS SERVIDORES DA UFSM - JAMES PIZARRO (DIÁRIO - Caderno MIX - Seção MEMÓRIA - edição 3.10.2020)

Quando casei em 1966 aluguei uma casa à rua Duque de Caxias, a poucos metros da praça da CORSAN e da casa onde residia o meu ex-professor Adelmo Simas Genro. Era um corredor com várias casas. E todas as casas eram de propriedade da dona Guilhermina Arens e seu esposo. Na primeira casa, de alvenaria, morava o filho único da dona Guilhermina, de nome Ernesto Arens, casado com Ruth Lippold, filha do casal Fritz e Elza Lippold, tios da minha esposa. Fiquei muito amigo do Ernesto, que era formado em Administração e professor na UFSM. E que tem relação com a história que passo a contar hoje. Eu trabalhava em três empregos quando casei. E seis meses depois de casado fui contratado como professor da UFSM, já em 1967. Numa conversas casual, o Ernesto Arens me disse : “Funcionários da UFSM ligados aos setor administrativo e da contabilidade outros fundaram uma Cooperativa e tu podes te associar como professor e comprar gêneros, fazer rancho, descontar no salário no final do mês”. Foi assim que fiquei sabendo da existência essa entidade que desempenhou um papel tão importante na vida de tantas pessoas. E quero resgatar parte dessa história para os mais moços da cidade. A CRIAÇÃO A Cooperativa dos Servidores da Universidade Federal foi criada na década de 60 e instalada atrás do “Garajão” em 1967/68. Naquela época aquela zona era quase deserta, com raras construções ligadas à UFSM, pois existiam terrenos baldios na rua 24 horas e nos fundos da Antiga Reitoria, assim como na esquina com a Floriano Peixoto. Para fazer justiça à verdade, devo dizer que a ideia da Cooperativa nasceu na DCO - Divisão de Contabilidade e Orçamento da UFSM, hoje modernamente denominada DCF - Departamento de Contabilidade e Finanças. O grande idealizador foi Hélio Rodrigues da Silva, então Diretor da DCO, e que também revolucionou as iniciativas locais com a ADMINISTRAÇÃO/70, movimento que consolidou o Curso de Administração na UFSM. Outros dirigentes da UFSM que foram importantes devem ser registrados por uma questão de justiça nessa nossa terra tão sem memória : Walter Calil, Vinicius McGinity, Carlos Augusto Cunha, Ney Ramos Penna, Antônio Carlos Arbo, Antônio Carlos Machado, Ayrton Vallandro Marçal, Ernesto Guilherme Arens, Waldyr Pires da Rosa, dentre outros. Conheci todos, muitos dos quais infelizmente já falecidos. Mas desejo fazer uma especial e afetiva referência à enfermeira Ione Rocha Lobato que, enquanto pacientemente aguardava o término das obras do Hospital Universitário, dedicou sua capacidade e parte de seu tempo na consolidação da cooperativa. OS ASSOCIADOS Nos anos 60 a UFSM tinha no seu corpo técnico-administrativo 217 funcionários e 250 docentes. Mas tinha 900 operários de obras que trabalhavam como celetistas da UFSM na execução direta das obras, pois não haviam empresas empreiteiras contratadas. E tinham também os empregados da ASPES - serralheria, pedreira, marcenaria - contingentes de operários que faziam seus suprimentos ou pagando com “bônus”. Esses eram vales os famosos vales” com descontos em folha controlados severamente pelo Moacyr Rocha. A área do armazém da Cooperativa que fornecia secos e molhados, bazar, confecções, açougue e mercearia, estava sempre repleto de consumidores. AUGE DA COOPERATIVA Além do reitor Dr. Mariano, mais quatro outros membros da Administração Superior da UFSM foram essenciais: Hélios Homero Bernardi, Derblay Galvão e Armando Vallandro. Aliás, o Prof. Armando Vallandro foi um operário desta causa e o grande sucesso da cooperativa se deve a ele. Na área financeira deve ser feito um registro especial ao talento de Adelino Ribeiro de Moraes e seus auxiliares mais diretos, dirigentes institucionais tinham autonomia de gestão. Em relação à contabilidade da cooperativa deve ser feito um registro : o meu amigo Rubem Höher desempenhou durante muitos anos, voluntariamente, as funções de Contador da instituição. Até o momento em que os serviços e o movimento da cooperativa se avolumaram tanto que foi necessário profissionalizar a contabilidade, ocasião em que foi contratado o escritório de Luiz Carlos Lang. Também registre-se a participação inestimável de José Pereira Ritzel. Gerenciava a cooperativa o seu Homero, chefiava os caixas a Amábili, supervisionava o açougue e mercearia o Didi e no Escritório trabalhavam o Renato Höher, o Antônio Carlos Flores, o Capitão e o Décio Flores. As cobranças e a conciliação dos bônus e dos descontos em folha era supervisionado pelo controlador da folha de obras, o Bica. O FINAL A cooperativa não teve condições de sobrevivência quando suas relações comerciais foram equiparadas às redes de supermercados, quando o Trevisan abriu mercado na Uglione - Chevrolet ao lado da Reitoria - e as grandes redes nacionais começaram agredir o mercado. Coube, ao professor Vallandro as iniciativas de encerramento. Sem traumas, sem passivo, sem alarde emocional. Apenas uma história encerrada após cumprida com honradez seu propósito. Já era final da década de 1970.