Esta é uma história triste que
jamais saiu da minha cabeça por mais que eu me esforce para que isso corra. Mas
basta eu olhar os morros da cidade que ela retorna num passe de mágica.
Lá pelos anos 50, quem descia
a avenida Rio Branco em direção à gare da Viação Férrea, em Santa Maria, RS,
olhava para o alto e contemplava enorme montanha até hoje existente.
No final da rua 7 de Setembro,
que ia terminar justamente nessa montanha, foi construído o Clube Esportivo,
tradicionalmente conhecido pelo nome carinhoso de "Clube do Sopé do
Morro".
Quem olhasse para o topo do
morro, atrás do Clube Esportivo, ia ver um pequeno chalé de madeira pintado de
branco, cognominado pela população de "Casinha Branca". Nessa
casinha, isolada lá em cima, vivia um casal de idosos. Eles desciam uma vez ou
duas por mês, através de uma íngreme trilha no meio do mato, para fazer compras
de gêneros alimentícios e remédios.
Um ou outro visitante subia
lá. Naquela época – tinha eu meus 14 ou 15 anos – era escoteiro da então
chamada Tropa de Escoteiros Henrique Dias, cuja sede ficava nas
dependências do então Círculo Operário, situado na esquina das ruas Silva
Jardim e André Marques. Eu exercia o cargo de secretário da Patrulha da
Pantera, cujo chefe era o saudoso amigo Wellington Landerdhal, jornalista da
Assembléia Legislativa do RS falecido há poucos anos. E era bastante comum a
subida da nossa tropa até à “Casinha Branca” para exercício físico e
acampamento de alguns dias nos feriadões ou fins-de-semana.
Certa vez, o dono do armazém
onde o casal de idosos fazia suas compras, estranhou a ausência dos
mesmos. E resolveu subir para ver o que tinha havido. Em lá
chegando, encontrou o corpo já em estado de decomposição dos dois pobres
velhinhos.
Diligências feitas pela
polícia logo acharam os culpados, dois marginais que trucidaram os idosos com
marteladas na cabeça, crime que chocou toda a cidade. E mataram o casal para
roubar alguns pertences de pouco valor e, segundo um deles confessou,
imaginavam que os idosos tivessem dinheiro escondido.
Já naquela época, há cerca de
60 anos, pessoas se retiravam para viver em paz no meio da Natureza. Na santa
paz das árvores, flores e pássaros.
Mas mesmo lá, satânicas
criaturas destruíram o sonho dos velhinhos a marteladas.
Mesmo depois de tanto tempo me
invade uma melancolia imensa ao pensar na agonia dos dois idosos, sentindo a
vida se esvair. Sob a brutalidade do ataque insano de duas mentes doentias.
Olhando lá do alto, com seus olhos esmaecidos pela catarata, os milhares de
pontinhos de luzes piscando na cidade. Sem que nenhum socorros lhes pudessem
dar.
Luzes faiscantes como
vagalumes. Que se acendiam e se apagavam.
Como a vida que estava a se
escoar de seus corpos minguados.
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