terça-feira, 16 de junho de 2020

ARTHURZINHO, UM AMIGO GIGANTE - JAMES PIZARRO (DIÁRIO, pág.4, edição de 16.6.2020)

Passamos por tempos estranhos. As pessoas estão nervosas. Fragilizadas. Sensibilidade exacerbada. E há razões de sobra para instabilidade emocional. Desequilíbrio no orçamento doméstico. Falta de reajuste salarial há anos. Milhares de desempregados. Ou medo de perder o emprego que tem. Queda das vendas. Crise financeira. Tudo é motivo para imediato debate eivado de agressividade. E há ainda a pandemia estremecendo os nervos de todos. Dia desses, desci ao subsolo do prédio onde moro pelo elevador de serviço para levar o lixo. Quando entrei, dei “bom dia” a uma senhora que estava já no elevador. Pois sou do tempo antigo, habituado a cumprimentar os outros. Imediatamente, sem me responder o cumprimento, ela lascou raivosa : “- Bom dia só que seja para o senhor, aposentado federal, vida mansa e acomodado”. Na véspera eu tinha feito um procedimento cirúrgico com o talentoso cirurgião e meu querido amigo Dr. Chariff DDine para remoção de um cisto na região inguinal, onde levei nove pontos. Estava ainda com dores. Olhei aquela senhora raivosa e ressentida. E me deu vontade de manda-la para um certo lugar. Mas lembrei dos conselhos da saudosa vó Olina, meu eterno anjo da guarda. E fiquei calado. Fiquei feliz com a minha resiliência. E ainda esperei ela terminar de colocar o seu lixo e fiquei segurando a porta do elevador para ela entrar. Tem de matar o ódio com a delicadeza, a educação e o silêncio. Mas em contraposição a figuras amargas como esta senhora, existem outras. Que fazem a vida valer a pena. E que faço meu personagem dessa crônica de hoje : meu amigo Arthur Neves da Silva. Funcionário do setor administrativo da FIAT há mais de trinta anos eu acho. Carinhosamente, conhecido em toda a cidade por Arthurzinho. Um modelo de simpatia e gentileza. Uma pessoa de relações. Com livre acesso em todos os segmentos da nossa cidade. O Arthurzinho tem uma bem constituída família, esposa enfermeira e duas filhas estudantes. Seu velho pai, meu amigo Severino, com 80 anos, mora com ele. E recebe todos os cuidados que poucos filhos neste país dedicam a um pai idoso, desde as refeições, banho, passeios e todo tipo de vontade. A esposa enfermeira trabalha no Hospital Universitário e também na Prefeitura Municipal, razão pela qual Arthurzinho assume tarefas múltiplas do lar para que a esposa – a quem muito ele admira pela capacidade de trabalho – possa desempenhar bem suas tarefas e ter suas necessárias horas de descanso. O Arthurzinho é meu companheiro de cafezinho na lancheria “Café & Doce”, do meu amigo Ildo, no Calçadão desde que regressei de Florianópolis. Mas não nos encontramos há mais de três meses porque estou em isolamento. Nos falamos pelo facebook diariamente ou pelo telefone. E uma vez por semana sou chamado na portaria do meu prédio porque há sempre uma lembrança ou agrado do Arthurzinho deixado lá. Ele sabe dos meus gostos. Uma semana traz conserva de pimentão. Ou cebolinhas em conserva vindas da Quarta Colônia. Ou rapaduras de amendoim. Ou bolos para “a tia Vera tomar café”. Em contraposição, a gente deixa na portaria pães feito em casa pela Vera Maria para ele levar. Devo uma série de gentilezas outras ao Arthur. De me acompanhar até em casa carregando coisas mais pesadas. Ou me trazendo remédios da farmácia quando está pelo centro. Ou me fazendo indicações de pratos especiais em restaurantes para telentrega. Ou telefonando para bater papo porque sabe que sinto falta de conversa com os amigos. E ele sabe – é da sua essência e da sua alma – ser companheiro e afetuoso com os outros. Numa época em que o mundo parece ser movido apenas por interesses econômicos. Por isso, esse registro público ao meu amigo Arthurzinho !

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