terça-feira, 14 de julho de 2020

AQUELA OLHADA POR CIMA DO OMBRO - JAMES PIZARRO (pág.4 do DIÁRIO,edição de 14.7.2020)

Naquele entardecer de 14 de julho de 1966 fazia muito frio em Santa Maria. E chovia muito. Tempo feio para uma data tão importante. Que certamente não era a data nacional da França. Com a tomada da Bastilha. Mas era uma data de outra tomada de posição. Diante dos familiares. Dos amigos. Da vida. E do mundo. Já no altar da Catedral de Santa Maria, ao lado dos padrinhos e testemunhas, o noivo espera. Pela noiva. E pelo monsenhor Érico Ferrari, oficiante do casamento, que pouco tempo depois seria bispo. E naqueles cinco ou dez minutos de espera, pela sua mente inquieta, desfilaram em imagens aceleradas dois anos de namoro e um ano de noivado. Tudo começou com aquela olhada por cima do ombro que ela lhe deu na “Primeira Quadra” – hoje calçadão Salvador Isaia – depois da saída da sessão de cinema no Cine Glória em 23 de janeiro de 1963. O que ensejou que ele lhe telefonasse naquela noite mesmo na cara e na coragem indagando “sutilmente” se a olhada tinha sido para ele mesmo. Depois de um silêncio soturno, a confirmação que iniciou o romance. O namoro iniciou no último dia do vestibular dele. Ele já trabalhava – com 21 anos – como auxiliar administrativo concursado do SAMDU e dava aulas de Biologia no Santa*Anna e cursinho. Todo dinheiro que ganhava era parte empregado no sustento pessoal e parte investido na compra de móveis e demais objetos para montagem de uma casa, o que enchia de espanto os familiares dela. Pois tinha recém começado o namoro e com pouco mais do que 16 anos, ainda fazendo o Curso Normal no Olavo Bilac. Três anos se passaram e o destemido e teimoso moço alugou uma casa e montou toda a estrutura para morar um casal. E passou ele mesmo a morar sozinho nela. Pediu a moça em casamento quatro meses antes mesmo da formatura dele. Os mais velhos da família, de ambos os lados, viam com temor aquela pressa e achavam uma ousadia. Mas nada podiam objetar porque o moço era estudioso, trabalhador e a moça o queria. Ele trabalhou quase meio século como professor universitário. E também em rádio, TV e jornal. Ela é e formada em Educação Física. No dia de hoje ambos estão comemorando 54 anos de casados. Bodas de Níquel. Para quem estuda Química, o níquel é um material de grande ductilidade, que é a capacidade de suportar deformações, fraturas e rompimentos mesmo quando submetidos a cargas. E também tem grande maleabilidade, além de ser resistente à corrosão e à ferrugem. Nada mais simbólico do que o níquel para marcar estas bodas de 54 anos de casamento. Levando-se em conta que a média de duração dos casamentos no Brasil atualmente é de 4,5 anos apenas, segundo dados do IBGE. Há necessidade nas relações a dois de muita resiliência, companheirismo, paciência, capacidade de perdão, maleabilidade e ductibilidade. Daquela olhada por cima do ombro naquela distante noite de 1963 em plena “Primeira Quadra” brotaram hoje três filhos, seis netos, genros, nora. E a certeza cada vez maior de que não existe nada mais importante no mundo do que a família. Eu te amo, Vera Maria ! Parabéns pelo nosso dia !

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