terça-feira, 19 de outubro de 2021

O OUTRO PROFESSOR PIZARRO - James Pizarro (DIÁRIO - 19.10.2021)

O que lhes passo a contar agora ocorreu na década de 70. E é uma curiosa história. Que resolvi partilhar. Pois ela realmente é inusitada. Regressando de um passeio pelo Rio de Janeiro onde, entre outras coisas, visitaram o Jardim Botânico, Braulio e Edith - meus sogros – contaram-me que uma das aléias do referido Jardim Botânico possuía uma placa, onde estava a seguinte inscrição : “Aléia J. PIZARRO, 1902-1903”. Imaginei logo que deveria ser uma homenagem a um antigo diretor do Jardim BoTânico que, por coincidência, tinha o mesmo nome meu. Alguns dias depois, contando este fato para dois colegas do Departamento de Biologia da UFSM que eram professores de Botânica, indaguei se eles não conheciam publicações deste professor Pizarro, que começava a provocar a minha curiosidade. Diante da resposta negativa, a funcionária do departamento encarregada do fichário de livros na época – dona Maria – disse-me que já havia lido algo a respeito. Procurou no seu fichário e numa rapidez que me espantou , entregou-me um exemplar da revista RODRIGUESIA, de abril de 1945, revista do Jardim Botânico do RJ. Pois lá estava, na página 69, o retrato e a biografia do professor Pizarro. Li avidamente. E fiquei sabendo que o professor J. Pizarro nasceu em Pernambuco em 1842, exatamente cem anos antes de mim, pois nasci em 1942. E morreu num dia 21 de fevereiro, que é o dia de nascimento da minha mulher e também dia de nascimento do meu segundo filho que, por incrível que possa parecer, também se chama James. Fiquei gostando tanto destas coincidências e achei tão simpático o referido professor (com seus cabelos brancos e um enorme e bem cuidado bigode), que resolvi escrever para o Jardim Botânico solicitando mais dados a respeito do mesmo. Ele ingressou aos 17 anos no Colégio Pedro II, onde colou grau de bacharel em Ciências e Letras. Em 1866 doutorou-se em Medicina, dedicando o melhor de suas atividades ao estudo das Ciências Naturais. Ingressando no Museu Nacional, aí fez conferências sobre assuntos pertinentes àquelas áreas. Ocupou cargos na Administração, Diretoria Geral e Chefia das Seções de Zoologia, Antropologia, Paleontologia e Botânica. Da Botânica, ele preferiu o ramo que se relaciona com as plantas medicinais e sua classificação. Em 1872 foi catedrático da Faculdade de Medicina mediante concurso. Além de professor, o Dr. Pizarro foi representante do Brasil na Exposição de Viena. Foi diretor do Asilo dos Menores Desvalidos. Foi vice-diretor da Faculdade de Medicina e professor de Medicina Legal da Faculdade de Direito do RJ. Foi cirurgião da Armada por ocasião da Guerra do Paraguai. Teve várias condecorações. Morreu no dia 21 de fevereiro de 1906. A lista dos seus trabalhos não é avultada em quantidade, mas em qualidade e importância do seu conteúdo. Sua tese de doutoramento, a par dos aspectos clínico-cirúrgicos, traz interessantes estudos químico e farmacêutico dos alcaloides das estriquíneas. Também publicou tese sobre as “Solanáceas Brasileiras” e um trabalho sobre “Fundamentos da Fitografia Médica”. Depois de saber tudo isso a respeito do professor pernambucano J Pizarro, sobrou-me - além da admiração pelo seu trabalho e a imagem de um exemplo a ser seguido – uma ternura quase inexplicável, que tentei registrar aqui nestas poucas linhas. Saiba pois, querido professor Pizarro, onde estiver que – mesmo tantos anos depois de sua morte, ocorrida em 1906 – o senhor conquistou meu respeito, carinho e vigorosa admiração.

quarta-feira, 6 de outubro de 2021

DIA DOS ANIMAIS - JAMES PIZARRO (DIÁRIO - 5.10.2021)

Ontem, 4 de outubro comemorou-se o Dia Internacional da Natureza, o Dia dos Animais e o Dia de São Francisco de Assis, patrono mundial da Ecologia. Quero, então, fazer uma importante recomendação. Trata-se de um programa para ficar bem-informado sobre as principais ameaçadas à fauna brasileira e sobre o que está sendo feito para reduzir impactos negativos. O “1º Seminário da Fauna Brasileira – Os desafios da conservação” ocorreu em julho deste ano, promovido pela Fauna News e pela Agência Envolverde. Especialistas que pesquisam e trabalham com tráfico de fauna, caça, atropelamentos de animais silvestres em rodovias, e a relação entre saúde pública e fauna, estiveram reunidos em painéis temáticos, apresentando os trabalhos desenvolvidos para enfrentar esses problemas. O evento foi gratuito, transmitido pelo perfil no Facebook da Envolverde e Fauna News, e pelo canal do YouTube da Envolverde. Os principais pontos abordados foram os seguintes: Tráfico de fauna – perdendo a liberdade para viver como bicho de estimação; Caça – uma prática ilegal com lobby no congresso; Atropelamentos de animais em rodovias – como reduzir o massacre das rodovias e Fauna silvestre e saúde pública – humanos e animais em risco. Recomendo, ainda, um dos livros mais vendidos na Itália, de autoria de um padre franciscano, tem por título “Os animais também têm alma”. E em diversas igrejas, no dia 4 de outubro, é comum os sacerdotes promoverem celebrações especiais com bênção aos animais de estimação. Deve-se lembrar, também, da “Declaração Universal dos Direitos dos Animais”, proclamada pela Organização das Nações Unidas (ONU) para a Educação, a Ciência e a Cultura (), em sessão realizada em Bruxelas, na Bélgica, em 27 de janeiro de 1978. A declaração traz que “todos os animais têm direitos”. O desconhecimento disso faz com que o ser humano cometa crimes contra os animais. O texto destaca que se deve “ensinar, desde a infância, a observar, a compreender, a respeitar e a amar os animais”. Dentre os direitos dos animais devemos destacar: Art. 1º – Todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os mesmos direitos à existência Art. 2º – O homem, como espécie animal, não pode exterminar os outros animais ou explorá-los violando esse direito; tem o dever de por os seus conhecimentos ao serviço dos animais Art. 2º, 3 – Todo o animal tem o direito à atenção, aos cuidados e à proteção do homem “Art. 6º, 2 – O abandono de um animal é um ato cruel e degradante Art. 7º –Todo o animal de trabalho tem direito a uma limitação razoável de duração e de intensidade de trabalho, a uma alimentação reparadora e ao repouso Há também o Dia Mundial dos Animais de Rua, celebrado em 4 de abril. Nesse dia, homenageia-se os animais abandonados e que vivem nas ruas. Em Santa Maria, diversas pessoas recolhem e cuidam de animais abandonados, muitas vezes, com enorme sacrifício, sem ajuda oficial de ninguém. Existem médicas veterinárias que fazem trabalhos meritórios nesse sentido, além de ONGs e entidades que se dedicam a esta função, como o Criadouro São Braz e o Hospital Veterinário da UFSM, mas precisamos avançar. Sensibilizar o mundo oficial, sobretudo.

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

A MINHA DURA LUTA ECOLÓGICA - James Pizarro

No final dos anos 70/80 tentei explicar à comunidade através da mídia, com clareza e sem rodeios, o verdadeiro impacto ambiental provocado pela construção civil, sem controle, em nosso município. Eu tinha a intenção de fazer com que as empresas construtoras exigissem dos fornecedores certificados de que estes estavam agindo de acordo com as normas ambientais (leis, códigos, certificados de impacto ambiental, etc...). Muitos engenheiros e construtoras foram sensíveis ao tema, tendo entrado em contato comigo num primeiro momento. Mas a maioria das pessoas ligadas à área tratou de me ridicularizar, acusando-me de ser contra o progresso da cidade. Lembro de uma declaração do saudoso Dr. Wilson Aita, docente do Curso de Engenharia Civil da UFSM, que disse - em meu socorro - "que era necessário que a exploração dos recursos naturais fosse feita de maneira racional e organizada, dentro da Lei". Eu entendia que essa transformação iria precisar de tempo, de compreensão, de paciência e que, principalmente, estruturas mínimas deveriam ser criadas para permitir a adequação dos exploradores, tais como linhas de financiamento, custos compatíveis. Nunca fui cretino nem catastrófico para querer paralisar a construção de edifícios ou algo nesta linha. Mas queria que a cidade raciocinasse sobre a utilização dos recursos da Natureza para o bem-estar do homem, utilização adequada e dentro das normais ambientais vigentes, ações que minimizassem os danos e, também, meios de reparar os danos causados. Na realidade, eu queria expor - há quase meio século - para um público sem visão ambientalista, sem cultura ecológica, uma série de indagações... A madeira usada naquela época na construção civil vinha de onde ? Esta madeira possuía "selo verde" ? Ou grande parte dela representava uma gigantesca fatia retirada de florestas que estavam em extinção acelerada ? Rochas usadas no piso e no revestimento das construções (granito, ardósia, quartzitos) são degradação em estado bruto. De onde vinha este material ? Onde são extraídos não se formam crateras lunares, montanhas de rejeitos, desmatamento e assoreamento dos cursos de água ? O que falar do processo de extração e beneficiamento do calcário, que dá origem ao cimento, principal insumo da construção civil ? Já tinha sido feito um levantamento criterioso da destruição de grutas, de cavernas, da poluição dos rios e do ar ? Quais os responsáveis pela fiscalização desse setor de mineração, que relatórios públicos a população poderia consultar ? Uma particularidade curiosa em tudo isso é que esta poluição causada, direta ou indiretamente, pela construção civil não lhe produz o ônus social da degradação. Os impactos são, em sua grande maioria, invisíveis aos que moram na cidade. Mas existem os danos diretos, visíveis, causados pelos canteiros de obras, encontrados nas ruas e avenidas dos centros urbanos. Os danos são múltiplos, tais como a destruição do patrimônio arquitetônico, onde casas antigas, tradicionais, tombam como se fossem árvores na floresta. Há o carreamento dos resíduos de construção para os sistemas de drenagem urbana, entupindo bueiros, bocas-de-lobo, galerias, poluindo margens de córregos, ajudando a aumentar enchentes, alagamentos e derrubando casebres e ferindo gente. Cito um exemplo que me ocorreu. A repórter Ehlen Almeida publicou em "A RAZÃO" reportagem sobre a destruição de centenas de árvores em pleno centro da cidade para que, em seu lugar, fosse construído um imenso conjunto de prédios residenciais. O empresário Carlinhos Costa Beber fez coro aos meus protestos no programa "Sala de Debate", da rádio Antena Um, saindo em minha defesa. Mas a destruição estava feita. E nem ao menos se ficou sabendo, à época, se havia licença para que aquilo fosse feito. Poderia citar o vidro empregado nas construções, a extração de areia e a alteração da paisagem, com assoreamento dos cursos de água e destruição da paisagem. O alumínio e a fantástica quantidade de energia usada em sua fabricação, além da poluição causada pela extração da bauxita. A brita e os problemas causados pelas pedreiras, com destruição de áreas de preservação permanente, explosões que perturbam o sossego público, o desmatamento muitas vezes produzido. A fabricação de tijolos e a fantástica quantidade de lenha que é consumida em sua fabricação, além do que a extração de argila afeta as zonas baixas, lagoas e matas ciliares. Além da construção civil, o setor moveleiro e as indústrias de embalagens poderiam ajudar a frear a retirada ilegal e indiscriminada de madeira das florestas se passassem a exigir com firmeza de seus fornecedores a certificação ambiental. Mas tudo isso passa por sensibilidade, por educação ambiental, por vontade política, por diminuição de ganância, por mudança de comportamento. Graças ao apoio da Promotoria Pública, numa grande campanha que promovi contra as pedreiras instaladas dentro do perímetro urbano e que destruíam áreas de preservação permanente, os morros que cercam a cidade estão preservados. Consegui, mediante denúncia sistemática em Porto Alegre e Brasília, com apoio da Justiça local, na década de 80, o fechamento da pedreira da UFSM (onde eu era professor de Ecologia do Departamento de Biologia), pedreira Link, pedreira do Morro do Cechella, pedreira da Viação Férrea, etc...Mas a maior vitória nesse sentido foi o fechamento da pedreira do Morro do Cerrito, explorada pela Prefeitura Municipal à época, atividade proibida por lei municipal e pelo Código Florestal vigente na época, por constituir-se aquele morro no último resquício de mata nativa situado dentro do perímetro urbano. Foi talvez, a maior vitória que consegui quando “estive” vereador nessa cidade, com uma proposta ecologista de mandato. Dia destes, ouvindo uma rádio local, fiquei a escutar atentamente uma entrevista dada pelo Dr. Walter Bianchini, dono das fábrica de facas Coqueiro, de Arroio do Só, professor aposentado da UFSM e ex-secretário dos governos do Rio Grande do Sul e de Roraima. Ele dizia claramente : "Os morros de Santa Maria continuam de pé por causa da obstinação do professor James Pizarro". Tão acostumado a levar somente bordoadas, fiquei emocionado em ouvir este reconhecimento público. E fui dormir feliz aquela noite.