segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

NASCEU UM FEIJOEIRO DENTRO DOO DO MEU OPALA - JAMES PIZARRO (DIÁRIO - edição de 11.1.2022)-

Meu primeiro carro foi um fusca 1300, branco, DA 1358, que comprei do médico e poeta Prado Veppo, meu saudoso e querido amigo, também padrinho de casamento. Com este carro fiz diversas viagens a Curitiba durante três anos no início dos anos 70, quando fiz meu curso de especialização em Ecologia do Departamento de Biologia na Universidade Federal do Paraná, a primeira universidade federal brasileira, criada em 1912. Mas também tive outros carros como Variant e Brasilia, até me apaixonar pelos Chevrolet Opala. Com três filhos pequenos, porta-malas enorme, banco traseiro espaçoso, era a meu juízo o modelo ideal para quem tinha prole numerosa e tinha que carregar todo tipo de tralha nas férias. Tive vários Opalas. Mas o que ficou mais famoso entre meus amigos – em especial entre meus alunos da UFSM e do cursinho - foi um Opala branco, duas portas. Por algumas razões que passo a alinhavar. Nunca entendi patavina de máquinas, motores, peças e marcas de automóveis. Nunca assisti corridas de fórmula-1. Quando pifava alguma coisa no motor numa viagem para praia, por exemplo, quem consertava era a minha mulher, que entende tudo de mecânica, tem caixas com ferramentas e sabe nome de chaves e especificações técnicas que aprendeu com seu pai. Entende de eletricidade, platinados, baterias, bobinas, marcas de baterias e assuntos afins que para mim soam como temas esotéricos. De sorte que, sem motivação alguma para carros, os únicos cuidados que tive com os mesmos sempre se resumiram a duas coisas : freios e pneus. O resto nunca dei a mínima importância. Óleo sempre mandei completar, jamais troquei. Jamais gastei dinheiro em lavagem de carro, ainda mais sendo professor de Ecologia. Como não gastava dinheiro com garagem, o carro posava na rua, em frente de casa e era lavado pela água da chuva. Quando caía um temporal e a chuva era demorada eu botava um calção e munido de esfregão ou esponja e sabão, descia para a rua com a gurizada da vizinhança e todo mundo me ajudava a lavar o carro. Era uma algazarra alegre da qual tenho muita saudade. Apesar da cara de espanto e do olhar sizudo de desaprovação de alguns vizinhos nas janelas. Nunca fechei as portas do carro durante a noite . Como eu deixava o carro na rua, com essa medida eu evitava que o mesmo fosse arrombado ou tivesse os vidros quebrados. Uma madrugada eu vi que tinha um cara sentado dentro do carro fumando. Desci e fui lá embaixo falar com ele que ficou muito assustado, pensando que eu estivesse armado. Tratava-se de um morador de rua, conhecido das redondezas, que estava sentado dentro do carro fumando e ouvindo música. Calmamente eu fiz a ele a seguinte proposta : - Eu te autorizo a dormir todas as noites dentro do meu carro desde que tu deixe o cinzeiro limpinho, porque eu não fumo e detesto cheiro de cigarro. Eu saio para a trabalhar antes das 7 e te trago um troço para comer de manhã. Topas ? Ele topou na hora. E dessa forma eu passei a ser em toda a cidade o único sujeito a ter um vigia noturno para cuidar do carro. E ele tinha teto para dormir, música ambiental e café da manhã. Também ficou famosa a história do porta-malas do meu carro. Porque a borracha do porta-malas apodreceu e caiu fora. Chovia dentro e entrava sol pelas frestas. Um dia por aquele espaço onde existia a borracha apareceu um belíssimo pé de feijoeiro. Que fizeram a alegria dos alunos. Que fizeram algazarra e batiam fotografias. Foram me avisar. Abri o porta-malas e lá estava a explicação : dos restos de sacos abertos de carvão para churrasco sobravam pó que serviram de substrato para germinarem algumas sementes de feijão que escaparam de sacos rasgados de feijão comprados do supermercado que, por fototropismo, foram atraídas pelo sol que entrava pelo do porta-malas. Um dia proibiram de circular os carros de placas laranja, lembram ? Deixei o carro estacionado em frente de casa sem usa-lo para não infringir a lei. Certo dia, ao chegar em casa, os vizinhos me avisaram que o meu Opala tinha sido guinchado. Fiquei surpreso. Achei que daria muito trabalho procura-lo, pois detesto burocracia. Fui a uma revendedora e comprei outro carro. Até hoje não sei o que fizeram com meu Opala. Nunca me comunicaram nada. Faz uns 20 anos isso. De vez em quando me bate uma saudade do coitado...

Um comentário:

JOAO MARQUES disse...

OPALA .era meu sonho de consumo. Gostava da suspensão.e do motor potente. Nunca pude ter um . Mas dirigi um de 6 cilidros.que era um mimo. Tempo que a gasolina era coisa acessivel. E nao tinhamos Pre sal. eheh. Meu amigo Helio Michel tinha um galaxie. Cabia acho que quase 10O litros no tanque. Chegava nos postos, e se ficasse funcionando, nao enchia o tanque nunca, que tempos bons. Gasolina era coisa barata. E nao tinha Presal... abraço James. Antes que a natureza Morrra. Hora dessas vai ter carro andando com agua. E dai pode ser que muita gente morra de sede.