quinta-feira, 16 de abril de 2015


COLUNISTAS

Uma galinha cinematográfica


James Pizarro

por James Pizarro em 16/04/2015
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Santa Maria teve três grandes cinemas. Cine-teatro Imperial. Cine Independência. Cinema Glória. O Cine Independência virou um shopping popular, abrigando os camelôs que estavam pelas ruas da cidade. Ao invés do Gordo e o Magro, Hopalong Cassidy, Jesse James, Batman e Robim, temos hoje mercadorias do Paraguai. O Cinema Glória virou uma filial da Universal de Deus e depois uma boate. Ao invés dos grandes musicais com Doris Day, Gene Kelly, Fred Astaire, Pat Boone e Elvis Presley, sermões e dízimos. O Cine-teatro Imperial, na segunda quadra da rua Dr. Bozano, transformou-se numa filial da tradicional Casa Eny. No Imperial, Edmundo Cardoso apresentava grandes montagens teatrais com sua Escola de Teatro Leopoldo Froes.
Aos domingos, no Imperial, passava sempre um “filme de mocinho” (nome dado aos filmes de faroeste americano), seguido de um “seriado” (cada domingo passava um capítulo de uma longa história de aventuras, que chegava a durar dois meses). Na frente do cinema, antes das sessões, ocorria o tradicional troca-troca de “gibis” (revistas em quadrinhos dos heróis da época). Ou então, troca de figurinhas do famoso “Álbum das Balas Rute”.
O “Seu” Aurélio era o lanterninha do Cine-teatro Imperial, famoso pelo duro que dava na gurizada durante as sessões. Em sua homenagem existe hoje o “Cine-clube Lanterninha Aurélio”. Certa vez fiz uma aposta com os meus colegas da rua Silva Jardim. Apostei que entraria no matinê com uma galinha e que o Aurélio não veria. Não só entrei com a galinha dentro do casacão (chamado de “sobretudo” na época) como fiz uma barbaridade. Fui sentar na primeira fila de cadeiras do mezanino (a parte superior da sala de exibição).
E na hora mais romântica do filme, quando o mocinho pedia a mão da moça em casamento, eu atirei a galinha lá de cima. A coitada voou como podia e foi se estatelar na cabeça da piazada lá embaixo. O Aurélio interrompeu a sessão, no meio da algazarra da gurizada. Acenderam-se as luzes. E furioso ele foi ao mezanino. E queria saber quem tinha jogado o galináceo. Ninguém me acusou. E eu fiquei gelado de medo.
Mas ganhei a aposta: meia dúzia de Cyrillinhas, o refrigerante mais famoso da época, fabricado em Santa Maria mesmo. Maconha, cocaína, rachas de automóveis, motos numa só roda, roleta russa, agressão a professores, brigas de gangues juvenis, pichações. Ao ler nos jornais essas “brincadeiras” da gurizada de hoje, fico estarrecido. Perto dessa turma de hoje eu era um santo!

James Pizarro

James Pizarro

Professor aposentado da UFSM e ambientalista

Um comentário:

Maria Cezar disse...

Muito boas lembranças! Voltei aos tempos das matinés em São Gabriel.