quinta-feira, 24 de dezembro de 2015


COLUNISTAS

Natal


James Pizarro

por James Pizarro em 24/12/2015
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Meu pai sempre deixou bem claro que gostava mais do ano novo do que do Natal. Questão de temperamento ou motivos cristalizados na sua infância, não gostava do Natal. Também não era de frequentar igreja. Minha mãe acompanhava sua opinião. Mas a gente tinha a entrega de presentes e os protocolares cumprimentos. Vez por outra, minha irmã puxava uma reza.
Muitas vezes, devido ao orçamento apertado, ganhei sapatos, roupas e material escolar ao invés dos presentes que realmente eu gostaria de receber. Coisas que eu teria que obrigatoriamente receber. Era uma época dura. Meu pai levou anos a fio para construir a casa. E eu não reclamava. Pois entendia o sacrifício. Mas ficava chateado. Minha avó Olina sempre dava presentes do meu agrado.
Anos depois, quando comecei a namorar quem viria a ser minha mulher, passei a ter uma idéia diferente do Natal. Morava junto na casa dela a vó Elvira Grau, com mais de 80 anos. Luterana, como Edith, minha sogra. Minha sogra tocava órgão aos domingos no culto da igreja luterana de Santa Maria/RS, a primeira igreja alemã do Brasil a ter sinos em sua torre. Na noite de Natal, o coral da igreja luterana visitava a casa dos mais idosos da comunidade alemã. E entoava lindas canções em alemão. E faziam orações. Minha sogra partilhava com os visitantes cucas, doces feitos com esmero, habilidosa doceira que era. Eles comiam rapidamente, pois tinham de cantar em muitas casas e a noite era curta.
Vera Maria, inspirada na educação dada pela mãe, sempre cuidou muito da festa de Natal em nossa casa. Muitos dias antes da data ela fazia bolos, doces, cucas. Ficaram famosas as bolachas em forma de estrela com recheio de goiabada, que até hoje ela faz e que tanto sucesso tem no meio de todos. Nossos filhos sempre tiveram pinheirinho, presentes, guirlanda na porta da casa e, quando bem pequenos, até Papai Noel visitava nossa casa. Foram anos felizes. Os anos passaram e as grandes dificuldades financeiras também. Lutamos duro para isso. Por generosidade de Deus estamos com saúde e morando na praia, um sonho de décadas.
Alguns familiares estranham nossa decisão de viajar só em último caso, por doença ou morte. Mas deixamos bem claro aos filhos e aos cinco netos que temos e teremos sempre a imensa alegria de receber a todos aqui na praia, em nosso apartamento, oportunidades que eles têm aceito. Temos o direito de descansar. Fazer programas de vida para os últimos anos. Somos idosos. Mas com saúde mental suficiente para traçar nossos destinos.
Nesta noite de Natal de 2015, iremos à missa na matriz de Nossa Senhora de Guadalupe. Como sempre fazemos, vamos apenas agradecer. Não pediremos nada para nós. Mas vamos pedir pela saúde dos nossos filhos, netos, minha mãe, irmã, genros, nora e demais parentes. E rezar pelas almas de meu pai, sogros, avós e parentes falecidos.
E na ceia que faremos, recordaremos muito dos natais antigos. Certamente - entre foguetes e músicas que entrarão pela janela - lembraremos dos cânticos alemães da vó Elvira. E dos cabelos loiros e olhos azuis da vó Olina. Era uma época em que a gente era muito feliz. E não sabia.

James Pizarro

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